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A crítica feminista no reconhecimento do sujeito-autora

Atualizado: 20 de abr. de 2020



Novas cartas portuguesas

Eu quero escrever com o vigor de uma mulher

Não me interessa escrever como homem

Lya Luft


Com esses versos, Luft nos remete a uma das discussões mais latentes em termos de crítica e fazer literário: a relevância da autoria. Sobre essa relação, tensionando as noções de autoria e obra, Carolina Saavedra elucida: “Eu não sei o livro, o livro é que me sabe”,¹ trazendo novamente para o centro da conversa qual é o lugar do autor e qual é o lugar da obra, dando a entender que a obra transcende a autoria de maneira tamanha que perdem-se as marcas que delimitam esse sujeito-autor.


Diante de tantas abordagens que privilegiam a dimensão da obra em detrimento da autoria, nos parece importante voltarmos o olhar para quem, afinal, é esse autor pretensamente universal a quem a obra ultrapassa, principalmente em tempos de reivindicação de narrativas.


O autor universal, na maior parte das vezes, esteve/está identificado com o cânone, representação masculina e branca, que carrega consigo tanto o poder de estabelecer os paradigmas literários quanto a aprovação da crítica, criando um movimento ao mesmo tempo dialético e circular. Dessa forma, observando os vínculos ideológicos entre uma autoria constituída predominantemente por grupos historicamente poderosos e uma crítica igualmente composta de indivíduos provenientes do mesmo lugar social que os primeiros, não surpreende que em algum momento a relevância da autoria como marca fosse “desprezada”, uma vez que a experiência desse autor é encarada como a experiência de toda a humanidade.


A crítica feminista, no entanto, resgata a importância da autoria ao projetar a mulher escritora como uma produtora de estética possível, à revelia da posição estanque de musa, e questionar instâncias já consagradas pelo cânone. Ao priorizar a perspectiva hermenêutica das mulheres, demonstra que nesse caso demarcar a autoria é fundamental para comunicar especificidades que várias vezes excedem a obra, rompendo com o entendimento masculino de “literatura feminina” e reclamando a palavra a partir de outra concepção de mundo.


Nesse sentido, como aponta M. Blecher ao qualificar a experiência como um "um rastro formado pelo corpo", considerar as particularidades que as mulheres experimentam num sistema de dominação que incide especialmente sobre seus corpos é primordial para a crítica feminista, que cumpre uma função que vai além da denúncia, procurando contestar discursos já sedimentados e ampliar as vozes das mulheres na árdua tarefa de fazer valer seus próprios parâmetros.



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