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Deslocamento de perspectiva - resenha capítulo 1

Atualizado: 20 de abr. de 2020


hooks, bell. Teoria feminista: da margem ao centro. São Paulo: Perspectiva, 2019 (1984). Tradução de Rainer Patriota.


Na apresentação feita por Cláudia Cardoso, Teoria feminista é a obra na qual bell hooks visa a construção de uma epistemologia feminista decolonial. Segundo Cardoso, hooks assumiu nesse livro um compromisso ético, político, teórico e prático com base na experiência marginal e fez da própria escrita um verdadeiro instrumento de mobilização para uma nova ordem social.


Já no prefácio, intitulado "Ver a luz: feminismo visionário", é fácil reconhecer seu propósito estratégico de organizar e combater o sexismo. Estratégia que exige, para ela, uma mudança radical da orientação do pensamento feminista, com o interesse de torná-lo um movimento de massa que se atente cada vez mais para a inter-relação entre gênero, raça e classe. Para isso, ela acredita que o movimento feminista deve continuar autocrítico para que nossa teoria permaneça fluida, aberta e sempre permeável ao novo. Superando as difamações da mídia patriarcal e ressuscitando o movimento como impreterivelmente necessário.


Para bell hooks, estar na margem é fazer parte de um todo, mas fora do corpo principal. Sua proposta de deslocamento de perspectiva, desde a margem até o centro, molda uma teoria feminista mais pé no chão e suficientemente crítica para transcender as reformas e fazer uma (não romantizada) revolução. É uma escrita viva, que incentiva o questionamento do status quo e que possibilita realizar os mesmos passos de deslocamento. Sem dúvidas, é um livro para quem já se cansou das discussões liberais sobre o feminismo e para quem quer ser desafiado a construir uma consciência política radical sobre o movimento.


No primeiro capítulo, "Mulheres negras: formação da teoria feminista", as mulheres negras são centrais no desenvolvimento dessa epistemologia feminista decolonial, pois são elas que desenvolvem um estudo crítico dos princípios do feminismo a partir da marginalidade. Nesse viés, o capítulo se encarrega de discutir certos assuntos que são cruciais para a compreensão de sua proposta. Listei alguns que mais subjetivei, são eles:


1. Crítica à perspectiva unidimensional sobre a realidade feminina

O domínio do discurso feminista pelas mulheres brancas ofusca a pluridimensionalidade da realidade feminina. O que a supremacia branca exibe não corresponde verdadeiramente à experiência da mulher como grupo, porque se quer refletir a partir uma consciência de raça e classe.


2. Sexismo institucionalizado

Como sistema de dominação, o sexismo é institucionalizado sob a regência do capitalismo e tem a missão patriarcal de restringir o comportamento das mulheres em alguns âmbitos, entretanto, ele nunca foi capaz de determinar de modo absoluto o destino das mulheres. Desviando do posicionamento vitimista, hooks entende que o sexismo não significa completa impossibilidade de escolha e muito menos ausência de responsabilidade.


3. Uso do termo “opressão”

Para ela, o uso do termo “opressão” é importante porque situa a luta feminista na moldura de uma política radical, mas indica que a tal ênfase na ideia de uma “opressão comum” recai na perspectiva unidimensional sobre a realidade feminina e permite que muitas mulheres privilegiadas encontrem motivos para ignorar as diferenças entre o seu status social e o status da maioria da população feminina.


4. Oportunismo individual x causa coletiva

A usurpação do feminismo pelas mulheres burguesas, para assistir seus interesses de classe, faz parte de uma ideologia individualista liberal que compromete a luta feminista. Ao invés de reivindicarem a erradicação do sexismo, as mulheres começaram a criar expectativas de se igualarem aos homens. Deixando, assim, de lidar com questões que dizem respeito a todas nós como causa coletiva e se contentando com reformas.


5. Radicalização da luta feminista

É preciso encorajar as ideias alternativas e dar voz às mulheres que anseiam por estratégias diferentes, resistindo às cooptações.


6. Circunstâncias sociais: fundamentos distintos entre as mulheres

Desde o início do capítulo, bell hooks foi deixando explícito que a consciência da luta feminista é estimulada por circunstâncias sociais que permitem diferentes formulações de questionamentos sobre a política de dominação masculina. Nesse sentido, a mulher busca sempre contestar a socialização sexista a partir da sua particular experiência feminina. Nos capítulos que se seguem, hooks trabalha essas abordagens a partir de temas específicos que moldam a teoria feminista.


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Carolina Lemos, geógrafa interessada na geopolítica das mulheres, tem 26 anos e estuda estratégias de organização e resistência social de mulheres no território em rede. Sapatão, suburbana e artesã (@artesasdevenus), faz da leitura e da escrita um verdadeiro ato político.

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