Brincando de espera
O sol no quintal é uma piscina
de luz, há dias em que
meu único gesto de amor
é lavar os pratos
por isso lavo com afinco
as mangas na árvore
do vizinho são pequenas
e verdes
como uvas
mas não são uvas
são mangas que vão crescer
e estarão pecas
pequenas bolas de sangue
no piso branco
da sala
fefe está menstruada
eu também
o destino: a encrenca
para a qual a sua vida
se encaminha
quero me apaixonar
e escrever poemas
mas tudo o que tenho
é a minha concentração
centenas de horas
as gradações do céu
a estrela que me olha
quando eu disse
que queria algo mais perto
quis dizer que choro
quando penso que
nunca mais serei abraçada
você riu
eu também
porque quero ser descolada
quando cruzo meus braços sobre meus joelhos
e encosto ali minha cabeça
sinto meus cílios roçarem meu pulso
veja bem
eu não sei o que é o amor
se você me beijar agora
vou lembrar e esquecer
como é ter um corpo
se você me beijar agora
vou esquecer
Clarisse Lyra nasceu em Feira de Santana, Bahia, em 1988. Pesquisa literatura, revisa textos e escreve poemas.
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