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Três poemas de Sarah Israel

Atualizado: 20 de abr. de 2020


©Unsplash

Não te importa o claro

ou o escuro desses destroços

ou se sou eu que

aqui habito

ou se são

as baratas da louça

tanto faz, né?


Coberta de eus imaginários

deito no que um dia foi taco

agora cimento

poeirento

da casa aos pedaços

com enormes teias

as paredes lascadas ainda

gritam

enquanto que com o teto zangado

já não arrisco uma conversa

e não sei mais a diferença

da umidade e das minhas veias.


Volto aos pensamentos mágicos e míticos

choro em surdo que há muito

não desejo

enrubesço aos apelos negativos misturados

às vontades que

em silêncio alimento e beijo.


É na madrugada que me banho de baba

e espero ficar limpa

tenho olhos inchados

água em sal e pus

a boca que mal fecha

o corpo numa dor desgracida.

É na madrugada que me lambo as feridas

na espera da cura ou da infecção

quieta num canto escuro

assustada com o que chamam de vida.

É na madrugada que cheiro o ar

e cuspo sangue,

cuspo tudo que me prende,

balanço o rabo um pouco

treino arranhar os outros

me enfio debaixo da cama

com o pelo eriçado de medo

e lustroso de saliva.

É na madrugada que temo o próximo dia.


Autofágica

Vontades e sonhos

como pequenos buracos

no meu corpo

cheios de larvas brancas

me comendo pele gordura músculo

e coça

e arde

e dói

e grito

e cada dia mais profundo.

Atingirão o osso ou já terei morrido?

Usarei mais tampões ou mais vermífugos?


Novos buracos a todo momento

ínguas pelo pescoço e virilha

noites sem dormir

confusões febre

convulsões.


Eu choro angústia

enquanto me pergunto:

Como me acalmar se moribunda

me devoro?


_

Sarah Israel pode ser muitas coisas e nada também. Pode ter graduações no público e no privado, tentativas mil de muito ou pouco, pinturas em quadros, até parto, anel, o chão e o céu. Mas o que a importa é que seja lida. Lida porque é assim que consegue transmitir alguma emoção, deixar um pouco de si, sem nem saber quem a toca pelos olhos e a comporta ali dentro, dando algum sentido ao que fora lido de si.

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